Uma coisa boa da globalização é a aproximação que ela cria entre as pessoas que desfrutam do acesso a informação nos grandes centros do Brasil e do mundo.
Hoje em dia, é provável que uma pessoa que viva numa cidade como Belo Horizonte tenha muito mais a compartilhar (não humanamente, porque para isso não existe fronteira geográfica nem cultural) com alguém que viva em Buenos Aires, Estocolmo ou Natal do que com alguém que viva aqui ao lado, em Nova Lima, por exemplo, e que não esteja imerso nesse trânsito intenso de informação.
Nesse rolo compressor de referências muito se consome, se digere, se transforma e se produz.
Na música, por exemplo, no rock, pra ser mais específica, não existe mais aquela predominância da produção no eixo econômico brasileiro Rio-São Paulo. Isso porque a informação não se concentra mais exclusivamente nos pólos econômicos. O dinamismo no escambo de referências, questionamentos, estéticas e experimentações pode ser compartilhado por qualquer um que “freqüente” a internet. Com isso, a produção de rock, hoje, está pulverizada por todo o país. Existem representantes do estilo e cenas se fortalecendo por todo o território.
É claro que nesse bolo muita coisa não possui consistência, mas há, também, muita coisa interessante e significativa.
As duas últimas melhores descobertas que eu fiz, Los Porongas e Vanguart, são duas bandas provenientes de locais totalmente fora do eixo tradicional (Rio-Sampa) e também fora do eixo “alternativo” (Recife-Brasília-Porto Alegre). Los Porongas é de Rio Branco e Vanguart, de Cuiabá.
O mais interessante nessas duas bandas, a meu ouvir, é que ambas conseguem criar um som alicerçado em referências universais do rock e perpassado por particularidades nacionais e regionais. Quando eu falo em referências regionais não estou me referindo a esse regionalismo caricato e clichê que andam explorando por aí. É algo mais sutil que parece ser proveniente simplesmente de uma memória musical e poética dos artistas e suas influências. Não é uma necessidade oportunista de enaltecer o regionalismo ou de reverenciar esse ou aquele “mestre” do rock. São sonoridades produzidas por alguém que digeriu suas influências e conseguiu, sem se apegar a nenhuma delas, criar uma identidade própria. Por exemplo, o Vanguart foi citado num programa de televisão como um representante da folkmusic. Ao ouvir aquela viola em “Foreign Complaint” eu entendi porque. Essa música me remeteu imediatamente a artistas nacionais (talvez Almir Sater) conhecidos como sertanejos de raiz, caipira, ou sei lá, folk nacional. Não sei se foi isso que inspirou os caras, mas foi essa a sensação que eu tive ao ouvir os primeiros acordes. Por outro lado, o começo de “Blood Talking” me trouxe à memória “I’d love to change the world” do Ten Years After. Eu poderia falar de inúmeros outros resgates que me ocorrem, como a guitarra floydiana em “Cachaça”, a inevitável comparação com o vocal de Thom Yorque aqui e ali, mas, enfim, meu objetivo não é especular as referências dos garotos e sim, defender a personalidade musical que provém de uma costura (inevitável, hoje em dia) sonora de referências. Eu venho a público defender essa construção porque existem pessoas, ainda hoje, capazes de alegar mediocridade criativa nesse processo, como se fosse pertinente discutir originalidade atualmente, da mesma maneira que se discutia nos anos 60. Tanto no Vanguart quanto no Los Porongas (sobre os quais eu nem vou especular. Vocês se quiserem vão lá no site deles que já passei aqui no blog e tirem suas próprias conclusões- e depois me falem) as referências emergem e se dissolvem sutilmente, sem afetação, para formar uma grande massa sonora com identidade própria, nem ressaltando, nem dissimulando as influências. Quando elas tiverem que sobressair, que sobressaiam. Que ninguém aqui (eu acho) está tentando romper fronteiras e, ingenuamente, propondo um som original. A originalidade, no rock, é um artifício que conseguiu sobreviver até “OK Computer”, TALVEZ. Mesmo nele é possível detectar referências explícitas. Mas quem se importa em ser pioneiro vivendo num mundo globalizado? Todas as fronteiras já foram transpostas. O mais importante hoje é saber se mover, é não desperdiçar as referências e fazer bom uso dos caminhos que já foram desbravados. A dificuldade quando se tem muitas referências está em saber discernir o que pode ser eliminado. É esse o pulo do gato atualmente: usar o filtro com bom senso e criatividade. Tem muita gente desorientada por aí que não consegue se livrar do que é desnecessário. Citando Los Porongas, naquela que é a minha música preferida do álbum: tudo que não me interessa agora, eu jogo fora...
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2 comentários:
Ô! tava mesmo precisando fazer um blog, hein? Quanta produção! Vim prá falar que morri de rir com a Hein? Pada, mas já tava essa profusão toda de textos.
Não tô conseguindo acompanhar o ritmo. Güenta as pontas que devo ter uma folguinha em dezembro. Se você prometer não aumentar o número de textos em proporção geométrica, até que dou conta de por a leitura em dia.
bjim e inté
perfect words at 5:47 am.
. to light up the mind.
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