segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Alzheimer coletivizado

Vamo lá. Esse foi o texto que me fez chegar aqui. Um amigo que leu me disse que eu precisava publicá-lo e sugeriu que eu fizesse um blog.
Taí o bendito:

A sociedade humana está sofrendo uma crise de Alzheimer coletivizado.
O excesso de estresse parece estar sobrecarregando as funções emocionais da nossa grande comunidade provocando uma regressão “comportamental”.
Eu explico. Outro dia eu vi, na televisão, o anúncio de um novo programa (mais um da série de reality shows) cuja proposta é dar uma ajuda às pessoas que não conseguem romper um relacionamento. Parece incrível, mas existem pessoas que não conseguem dar o famoso “pé na bunda”. Excesso de sensibilidade? Não. Incompetência emocional mesmo.
Eu sempre desconfio da veracidade desses programas porque me custa crer que realmente existam pessoas que não consigam, por exemplo, dar o fora em alguém (a ponto de pedirem ajuda “externa”), mas o simples fato de existir uma proposta de programa como essa (e considerando-se que esses programas são elaborados com base em pesquisas marketeiras, em perfis psicológicos de massa, etc, etc) comprova a existência de um público para tal, ou seja, tem alguma coisa no ar.
Quando começou essa onda de reality shows, oferecendo todo tipo de suporte a pessoas comuns, eu achei que fosse uma moda passageira e que isso não iria muito longe. Mas, a cada dia que passa, surgem novos programas e, a cada dia, parecem mais banais os suportes e, por outro lado, mais grave a degeneração emocional.
Se alguém dissesse a qualquer uma das minhas avós, há 50 anos, que seria publicado um “manual” cuja proposta seria ensinar aos pais como educar os filhos, elas com certeza não compreenderiam a necessidade. Mas hoje, essa necessidade parece estar cada vez mais presente. Quem nunca ouviu falar da Super Nanny? Assistir ao programa nos remete a um quadro que está se tornando muito comum: pais que perderam completamente o controle sobre o estabelecimento da noção de hierarquia dentro de casa. Há alguns anos, a frase anterior me soaria quadrada, autoritarista e opressora. Atualmente, entretanto, a palavra hierarquia deixou de soar como um mero artifício de poder. A forma como os pequeninos estão manipulando os adultos é evidente, menos, é claro, para aqueles que são os responsáveis pela perda do controle. Na verdade, acho que não é uma questão de controle, e sim, de equilíbrio saudável de papéis. A balança não tem que pender pra um lado só, mas cabe aos pais, indicar a medida saudável nesse balanço. E não é isso o que vem acontecendo. O que podemos assistir são cenas, nas quais, filhos são protagonistas ditadores, manipuladores e egocêntricos. Isso porque há, de um lado, uma mídia que influencia cruelmente as crianças e, por outro, pais que cedem à pressão e moldam a educação baseados numa relação de troca, compensação e culpa. Se de um lado você tem filhos autoritários e imperativos, do outro você tem pais impacientes, indecisos, inseguros e infantilizados. É comum, nos programas da Super Nanny, ver pais chorarem de desespero por não conseguirem lidar com os próprios filhos. A babá é, na verdade, babá dos pais.
O meu objetivo aqui não é problematizar a relação “pais e filhos” no mundo moderno. Por isso estou, de certa forma, simplificando os argumentos para ir mais direto ao ponto que desencadeou essa reflexão.
Eu me ative ao exemplo da super babá, mas poderia ser a qualquer um dos vários outros exemplos de programas do gênero. Alguns programas lidam com questões mais profundas (por exemplo, educação dos filhos e obesidade) e outros com dificuldades mais banais. Há programa para ajudar pessoas a conseguir namorar, casar, decorar a casa, educar os filhos, se vestir, ter estilo, decidir pra onde viajar, se alimentar, perder peso, abandonar vícios, ficar bonito e agora até mesmo, terminar relacionamentos. E é aí que eu me pergunto: Quando foi que abdicamos do nosso próprio eixo? Que lacuna é essa que está sendo preenchida por esses “assessores emocionais”? Até que ponto vai chegar essa necessidade de ajuda (dentro e fora dos programas de televisão)? Em todos os programas, os profissionais contratados para dar a assessoria são uma espécie de figura materna (ou paterna) que alia uma postura severa e disciplinadora a palavras de incentivo e estímulo à autoconfiança e persistência. A minha crítica não está no surgimento de dúvidas, indecisões, crises existenciais. Isso faz parte da história da evolução humana e é o que nos move adiante. A questão é como nós lidamos com isso hoje em dia. Como foi que nós deixamos de ser capazes de encontrar soluções (das mais complexas às mais banais) para os problemas criados por nós mesmos? Se analisarmos, historicamente, a nossa evolução, vamos concluir que estamos nos tornando mais autônomos, ou, ao contrário, estamos criando novos problemas e passando pra frente a responsabilidade de encontrar respostas? Estamos, cada vez mais, “terceirizando” nossas emoções? O que nós estamos fazendo com toda essa informação à qual nós temos acesso hoje em dia? Ao invés de nos apropriarmos dessas ferramentas, nós preferimos nos tornar cobaias dos especialistas?

Estudos indicam que um dos fatores causadores do mal de Alzheimer é o estresse mental. O estresse danificaria regiões do cérebro e provocaria a degeneração com o passar dos anos. Um dos sintomas do mal é a “regressão comportamental”, chegando o paciente, muitas vezes, à condição de uma criancinha de 2 anos de idade, se tornando totalmente dependente, tendo que reaprender a falar, andar, comer...
Imaginando que a nossa sociedade humana é um grande e único organismo, eu diria que o caos, o estresse e os hábitos insalubres estão provocando uma degeneração nesse grande organismo do qual fazemos parte.
A humanidade evoluiu cientificamente, intelectualmente e tecnologicamente de forma exponencial nos últimos 30 anos. Por outro lado, estamos tendo que reeducar nossas emoções para lidar com coisas básicas como nos alimentar, por exemplo. Será que nos tornamos tão complexos a ponto de complicar, prejudicialmente, operações triviais do nosso cotidiano ou será que estamos só ficando mais burros no quesito "sobrevivência"?

6 comentários:

Anônimo disse...

Acho que alguem, que não vemos, que não aparece em jornais, revistas, televisão...
alquem que tem muito conhecimento e poder, e talvez não apareça nem no espelho...
alquem que sabe mais de nós do que nós mesmos, que usa este conhecimento para o mal e a dominação e que, ás vezes, aparece em nossos reflexos...
alquem está muito perto de nos dominar completamente.

Anônimo disse...

Amandinha,
o Rio Pacuí é lindo!!!
talvez seja o rio mais preservado que já nadei.
esse trecho da foto, fica na zona rural de Coração de Jesus, a uns 30m pros fundos da casa da vó da Caty. E eu nadei com peixes (num eram peixinhos não, cardumes de peixes grandes), experiência muito bacana!!!
Beijos procê!!!

Cerol disse...

Vou postar aqui os comentários que recebi via email:
Achei seu texto muito legal, muito mesmo.

De alguma forma, eu tentaria amarrar a questão das "celebridades" destes reality shows, que também mostra um pouco essa debilização mental à qual você se refere no texto. Como você tratou de questões contemporâneas, tente fazer um parágrafo falando sobre como a mídia, no caso a TV, conseguiu transformar os personagens dos reality em "mão de obra barata", pois não são pagos para aparecer e ainda geram lucro para as emissoras. Fazem isso com gosto, como bons débeis mentais.


Só pra terminar: marquei de amarelo o que eu tiraria do texto (quanta pretensão hein? Querendo editar o texto de uma graduada em letras.....rsrsrs...)

Só fiz isso, pra tentar adequar mais seu texto à linguagem jornalística, pois acho que você não deve apenas mandá-lo por e-mail. Tem que dar um jeito de publicá-lo, impresso ou eletronicamente.

Beijos,

Matheus


Oi Mandita....

Adorei o texto, querida...
Também achei no mínimo estranho ver a chamada de um programa especialista em pé na bunda...rsrsrsrrs
Entre outros que estão por aí....
Às vezes tenho a sensação que a TV a CABO está ficando igual ao Domingão do Faustão: Idiota, sem sentido e extremamente descompromissado com as pessoas que o assistem, e por isso, sem nem a mínima noção do que significa a palavra "QUALIDADE".....

É aquela velha história do "desligue a TV e vá ler um livro"...
É o melhor que fazemos, né...rsrsrsrrs


BJs e saudades...

Parabéns pelo texto...

Carol Lima


Gente,

a nossa sociedade, em um âmbito geral, está tão compromissada, tão exageradamente tomada por afazeres e desejos que se desconectou do SER humano.

é celular q não para de tocar, emails a todo momento, consumo a todo instante. Como poderemos olhar para nós mesmos, para nossa essÊncia única e verdadeira???

não podemos, afinal termos tantos desejos de consumo, tantos afazeres.

por isso que a maioria está precisando de assessores emocionais, pq simplesmente nos desconcectamos de nós mesmos, não sabemos mais o que realmente somos e queremos.

a maioria, sinto em dizer, está mais para mortos-vivos andando pelos shoppings centers.

vamos ter momentos únicos de total entrega ao ócio, ao não fazer, ao não consumo. ao não sermos mais inseridos em padrões, pelo menos por um instante!

cristina

p.s. amiga, adorei seu texto! título mais ainda. mto bom!!!!


"Se analisarmos, historicamente, a nossa evolução, vamos concluir que estamos nos tornando mais autônomos, ou, ao contrário, estamos criando novos problemas e passando pra frente a responsabilidade de encontrar respostas? Estamos, cada vez mais, “terceirizando” nossas emoções? O que nós estamos fazendo com toda essa informação à qual nós temos acesso hoje em dia? Ao invés de nos apropriarmos dessas ferramentas, nós preferimos nos tornar cobaias dos especialistas?"

Acho que a sociedade sofre é de uma Sídrome de Pânico coletiva, baseada principalmente em uma palavra e suas várias significações (ou em seus espaços de significação): SEGURANÇA. Precisamos nos sentir seguros em relação à pessoa que somos, precisamos garantir a nossa integridade física e daqueles que amamos, precisamos desesperadamente de segurança emocional, financeira. Autonomia? O caralho, porque estamos vivendo em uma sociedade que nos distancia, nos individualiza, nos superficializa (essa palavra existe?), mas no fundo queremos mais que tudo nos aproximar, debater, discutir, tocar, sentir. E agente não sente mais "como antigamente". Que autonomia é essa? Há realmente escolhas a serem feitas? De que ferramentas necessitamos para vivermos BEM com informação, conforto, segurança? Quando vai ser suficiente? Estamos realmente atrás de respostas? O que encontramos à disposição, ao alcance da mão pra sentir a qualquer momento? MEDO.

Medo de ser assaltado, abandonado, despedido, sequestrado, estuprado, desrespeitado, ofendido, humilhado (ai,ai)... Medo de perder as oportunidades que surgem, medo de aceitar as oportunidades que surgem, de arriscar uma nova carreira, medo de largar os estudos, medo de voltar a estudar, medo de começar relacionamentos, de terminar relacionamentos, de não saber criar os filhos, ou de se criar, medo de engordar, de emagrecer, de adoecer... "O meu prazer agora é risco de vida. Meu sex and drugs não tem nenhum rock'n'roll". Medo de morrer sem ter REALMENTE vivido. O que é viver? Ter em detrimento de ser. Morrer sem SER... E depois, o quê? O que tem depois da morte?... Mais?...Nada?

"Alguns pacientes referem diarréias intensas em determinadas situações. Outros tem todos os sintomas de uma Labirintite. Outros passam a ter pensamentos que não saem da cabeça de que poderiam ter doenças graves mesmo que todos os exames sejam normais, ou de que poderiam fazer mal a si mesmo ou a outras pessoas. Podem ocorrer pensamentos que a pessoa sabe que não fazem sentido, mas não consegue tirar da cabeça, por exemplo se atirar de uma janela, machucar alguém ou ela mesma com uma faca. Tecnicamente falando, pensamentos obsessivos, fazem do quadro clínico e desaparecem com o tratamento do pânico.

Taquicardia, sudorese, sensação de falta de ar, tremor, fraqueza nas pernas, ondas de frio ou de calor, tontura, sensação de que o ambiente está estranho, que a pessoa "não está lá" (isso se chama desrealização e não tem nada a ver com loucura, não se preocupe), de que vai desmaiar, de que vai ter um infarto, de uma pressão na cabeça, de que vai "ficar louco", de que vai engasgar com alimentos, assim como crises noturnas de acordar sobressaltado com o coração disparando e com sudorese intensa.Um medo muito comum é o de "voltar a sentir medo"."

Já sentiu algo parecido? Se não, ótimo, vc provavelmente não é mais uma candidata. O sintoma com o qual mais me identifico é o de "desrealização" rsrsrsrs...

Acho que é uma combinação de Alzheimer e Síndrome do Pânico o que tem imobilizado tantas pessoas ou levado essas pessoas a um nível de paralisia, engessamento e improdutividade (chame de rotina segura ou o que quiser), em que é mais cômodo delegar a outros a resposabilidade pelas decisões sobre si. Não sabemos o que fazer e agimos feito crianças. Há preços a serem pagos por toda e qualquer decisão tomada. As erradas, então, sai de baixo. Quem dá mais?

Ana Paula Fernandes

Cerol disse...

Ana, não quero comentar seu comentário, porque acho que já falei demais e teria que escrever outro texto pra te responder. Mas te adianto que concordo, sim, com seu ponto de vista e acho que já sofri de desrealização tb...rsrs
Pra gente botar essa conversa em dia, vamos ter que nos encontrar, o que significa q vc vai ter que SAIR DA TOCA! haha
bjão

Clarice disse...

rá! te mandei uma convocação procê sair da toca! muitas coisas, impossível comentar tudo aqui!

eu observo em algumas pessoas o que eu chamo de "síndrome do mãe,me limpa?". pessoas adultas incapazes de limpar a própria bunda sem pedir ajuda, suporte ou pelo menos uma opinião.

esses programas são a junção da fome com a vontade de comer. ou da insegurança máxima com a vontade de aparecer na tv. não sei se só um dos fatores (ou melhor, só o fator "infantilização") seria causador de tanto sucesso, um programa de ajuda pra qualquer coisa, gratuito, mas sem o bônus da celebridez instantânea não teria tantos adeptos. eu acho. até porque eles seriam sérios e esse tipo de gente tem muito medo de assumir qualquer compromisso, mesmo consigo próprio.

(...)

eu abri essa caixinha há umas duas horas e como não consigo concluir, talvez eu volte e fale mais. ou falemos na mesa do buteco, que é mais produtivo. :-)

Ricardo Foureaux disse...

Amanda, desliga a TV e liga o livro!