Vamo lá. Esse foi o texto que me fez chegar aqui. Um amigo que leu me disse que eu precisava publicá-lo e sugeriu que eu fizesse um blog.
Taí o bendito:
A sociedade humana está sofrendo uma crise de Alzheimer coletivizado.
O excesso de estresse parece estar sobrecarregando as funções emocionais da nossa grande comunidade provocando uma regressão “comportamental”.
Eu explico. Outro dia eu vi, na televisão, o anúncio de um novo programa (mais um da série de reality shows) cuja proposta é dar uma ajuda às pessoas que não conseguem romper um relacionamento. Parece incrível, mas existem pessoas que não conseguem dar o famoso “pé na bunda”. Excesso de sensibilidade? Não. Incompetência emocional mesmo.
Eu sempre desconfio da veracidade desses programas porque me custa crer que realmente existam pessoas que não consigam, por exemplo, dar o fora em alguém (a ponto de pedirem ajuda “externa”), mas o simples fato de existir uma proposta de programa como essa (e considerando-se que esses programas são elaborados com base em pesquisas marketeiras, em perfis psicológicos de massa, etc, etc) comprova a existência de um público para tal, ou seja, tem alguma coisa no ar.
Quando começou essa onda de reality shows, oferecendo todo tipo de suporte a pessoas comuns, eu achei que fosse uma moda passageira e que isso não iria muito longe. Mas, a cada dia que passa, surgem novos programas e, a cada dia, parecem mais banais os suportes e, por outro lado, mais grave a degeneração emocional.
Se alguém dissesse a qualquer uma das minhas avós, há 50 anos, que seria publicado um “manual” cuja proposta seria ensinar aos pais como educar os filhos, elas com certeza não compreenderiam a necessidade. Mas hoje, essa necessidade parece estar cada vez mais presente. Quem nunca ouviu falar da Super Nanny? Assistir ao programa nos remete a um quadro que está se tornando muito comum: pais que perderam completamente o controle sobre o estabelecimento da noção de hierarquia dentro de casa. Há alguns anos, a frase anterior me soaria quadrada, autoritarista e opressora. Atualmente, entretanto, a palavra hierarquia deixou de soar como um mero artifício de poder. A forma como os pequeninos estão manipulando os adultos é evidente, menos, é claro, para aqueles que são os responsáveis pela perda do controle. Na verdade, acho que não é uma questão de controle, e sim, de equilíbrio saudável de papéis. A balança não tem que pender pra um lado só, mas cabe aos pais, indicar a medida saudável nesse balanço. E não é isso o que vem acontecendo. O que podemos assistir são cenas, nas quais, filhos são protagonistas ditadores, manipuladores e egocêntricos. Isso porque há, de um lado, uma mídia que influencia cruelmente as crianças e, por outro, pais que cedem à pressão e moldam a educação baseados numa relação de troca, compensação e culpa. Se de um lado você tem filhos autoritários e imperativos, do outro você tem pais impacientes, indecisos, inseguros e infantilizados. É comum, nos programas da Super Nanny, ver pais chorarem de desespero por não conseguirem lidar com os próprios filhos. A babá é, na verdade, babá dos pais.
O meu objetivo aqui não é problematizar a relação “pais e filhos” no mundo moderno. Por isso estou, de certa forma, simplificando os argumentos para ir mais direto ao ponto que desencadeou essa reflexão.
Eu me ative ao exemplo da super babá, mas poderia ser a qualquer um dos vários outros exemplos de programas do gênero. Alguns programas lidam com questões mais profundas (por exemplo, educação dos filhos e obesidade) e outros com dificuldades mais banais. Há programa para ajudar pessoas a conseguir namorar, casar, decorar a casa, educar os filhos, se vestir, ter estilo, decidir pra onde viajar, se alimentar, perder peso, abandonar vícios, ficar bonito e agora até mesmo, terminar relacionamentos. E é aí que eu me pergunto: Quando foi que abdicamos do nosso próprio eixo? Que lacuna é essa que está sendo preenchida por esses “assessores emocionais”? Até que ponto vai chegar essa necessidade de ajuda (dentro e fora dos programas de televisão)? Em todos os programas, os profissionais contratados para dar a assessoria são uma espécie de figura materna (ou paterna) que alia uma postura severa e disciplinadora a palavras de incentivo e estímulo à autoconfiança e persistência. A minha crítica não está no surgimento de dúvidas, indecisões, crises existenciais. Isso faz parte da história da evolução humana e é o que nos move adiante. A questão é como nós lidamos com isso hoje em dia. Como foi que nós deixamos de ser capazes de encontrar soluções (das mais complexas às mais banais) para os problemas criados por nós mesmos? Se analisarmos, historicamente, a nossa evolução, vamos concluir que estamos nos tornando mais autônomos, ou, ao contrário, estamos criando novos problemas e passando pra frente a responsabilidade de encontrar respostas? Estamos, cada vez mais, “terceirizando” nossas emoções? O que nós estamos fazendo com toda essa informação à qual nós temos acesso hoje em dia? Ao invés de nos apropriarmos dessas ferramentas, nós preferimos nos tornar cobaias dos especialistas?
Estudos indicam que um dos fatores causadores do mal de Alzheimer é o estresse mental. O estresse danificaria regiões do cérebro e provocaria a degeneração com o passar dos anos. Um dos sintomas do mal é a “regressão comportamental”, chegando o paciente, muitas vezes, à condição de uma criancinha de 2 anos de idade, se tornando totalmente dependente, tendo que reaprender a falar, andar, comer...
Imaginando que a nossa sociedade humana é um grande e único organismo, eu diria que o caos, o estresse e os hábitos insalubres estão provocando uma degeneração nesse grande organismo do qual fazemos parte.
A humanidade evoluiu cientificamente, intelectualmente e tecnologicamente de forma exponencial nos últimos 30 anos. Por outro lado, estamos tendo que reeducar nossas emoções para lidar com coisas básicas como nos alimentar, por exemplo. Será que nos tornamos tão complexos a ponto de complicar, prejudicialmente, operações triviais do nosso cotidiano ou será que estamos só ficando mais burros no quesito "sobrevivência"?